Tinteiro #011: A política pela espada em 'Shogun'
Edição traz impressões sobre a série passada no Japão feudal, disco novo de Slash, Dostoievski e um faroeste da pesada
Salve, salve, gente amiga! Carteiro passando pra deixar sua nova edição do Tinteiro. Sem mais delongas, vamos ao que interessa. 😉😘
UM FILME
MICROSSINOPSE: Peão do trecho encontra um moribundo e um saco de dinheiro no pasto. O dinheiro é bom, o moribundo nem tanto, e o que vem atrás de ambos, muito pior.
EU ACHO QUE: “Old Henry” (Potsy Ponciroli, 2021, no Brasil saiu com inexplicável nome marmota “Retorno da lenda”) é um dos melhores faroestes que eu vi nos últimos (muitos) anos. Enxuto, instigante e com Tim Blake Nelson em estado de graça.
ONDE VER: “Old Henry” está disponível na Netflix.
UMA SÉRIE
MICROSSINOPSE: Pirata crente entra de gaiato na guerra pelo poder no Japão feudal e logo troca pistola inglesa por espada samurai.
EU ACHO QUE: apesar da absoluta falta de carisma do personagem ocidental, “Shogun” (2024) é uma série de drama político histórico que vai crescendo à medida que os personagens vão se enredando nas intrigas e cortando as cabeças uns dos outros. As cenas de combate são banhos de sangue bem gostosos.
ONDE ASSISTIR: “Shogun” está disponível no Disney Plus. 🎎
UM SOM
🐍 “Já ouviu o álbum novo do Slash?”🎩, perguntou meu amigo New Calegari, exímio guitarrista do conjunto RockTrackers, do qual eu calho de ser crooner. Só fui responder o zap um dia depois, “ainda não, só o single com o Brian Johnson”. New disse “loucura loucura loucura” sobre o disco em que o guitar hero do Guns n’ Roses recebe gente do naipe de Iggy Pop, Demi Lovato, Paul Rodgers e Gary Clark Jr. para reinterpretar clássicos do blues. Ouvi, pois, o referido álbum, chamado “Orgy of the damned”. Em que pese a produção meio caretona, o cancioneiro se sustenta. Portanto, sigo o relator: “loucura loucura loucura”.
QUER EM VÍDEO? TOMA “KILLING FLOOR”, DE HOWLIN’ 🐺 WOLF, NA VOZ DE BRIAN JOHNSON, CANTOR DE UM TAL AC⚡DC.
UM FRAGMENTO
“Começou a luta pela separação, pela autonomia, pela individualidade, pelo meu e pelo teu. Passaram a falar línguas diferentes. Conheceram a dor e tomaram amor pela dor, tinham sede de tormento e diziam que a verdade só se alcança pelo tormento. Então no meio deles surgiu a ciência. Quando se tornaram maus, começaram a falar em fraternidade e humanidade e entenderam essas ideias. Quando se tornaram criminosos, conceberam a justiça e prescreveram a si mesmos códigos inteiros para mantê-la, e para garantir os códigos instalaram a guilhotina. Mal se lembravam daquilo que perderam, não queriam acreditar nem mesmo que um dia foram inocentes e felizes.”
Texto extraído do livro “O sonho de um homem ridículo”, do escritor russo Fiodor Dostoievski, que recomendo (mas só àqueles que possam se entregar à viagem onírica de um homem ridículo, dentro da qual viceja a reflexão sobre a ridícula existência humana, que era assim em 1877 e assim continua em 2024).
UM MICRORRELATO
Depois de ficar três horas amarrada, encapuzada e ter seu corpo embebido em álcool, sob ameaça de ser carbonizada, Dona Linda não consegue mais dormir. Ainda bem que não te machucaram, levaram só bens materiais, repetem. Ela tenta acreditar. Passaram-se meses, mas ainda os ouve tomando banho em seu chuveiro. Bebendo seu uísque. Comendo sua comida. Utilizando seus talheres. Então desce as escadas no meio da madrugada e lava garfos e facas e copos. E sentindo no corpo o cheiro do álcool há muito evaporado, caminha até o quintal sob a lua cheia, tira toda a roupa e toma um longo banho de mangueira.
W. Del Guiducci, 24/05/2024
CRONIMÉTRICAS
Assim inicia a crônica desta semana na “Tribuna de Minas”:
“Por pouco não tive que dormir fora de casa hoje, por causa de uma bendita chave perdida. E mais que descobrir o paradeiro do chaveiro, me aterrorizava a possibilidade de ter de escrever esta crônica em uma mesa que não fosse a minha. Entendam como rabugice, inabilidade de lidar com mudanças, incapacidade de adaptação, importa-me lá. Deve ser tudo verdade e que seja. Sou desses que funcionam melhor na rotina, que não gosta de surpresas, que abraça a dádiva do hábito. Um devoto da prática, enfim.”
O restante você pode ler neste link.
POSTEI E SAÍ CORRENDO
Lá pelas tantas em “Shogun”, a bela Mariko-Sama diz para o agoniado pirata inglês:
“Conhece ‘A Cerca Óctupla’? Desde a infância é algo que aprendemos a construir dentro de nós. Uma parede impenetrável para trás da qual podemos nos retirar quando precisamos. Você deve se treinar para escutar sem ouvir. Por exemplo, pode ouvir o som de uma flor caindo ou as pedras crescendo. Se ouvir de verdade, sua circunstância atual desaparece”.
Essa pequena (e poderosa) aula de disciplina mental quadra muito bem aos ansiosos dias que hoje correm: quem entre nós encontra tempo ou paciência ou ambos para “ouvir o som de uma flor caindo ou as pedras crescendo”?
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Massa o Old Henry. Ainda digerindo o plot twist
Camarada, que sonzeira! O homem tem bom gosto mesmo.